Entrevista ao Álvaro Villarroel, treinador boliviano UEFA Pro e Vogal da Direção da AITF
AITF: Boa tarde, Álvaro. É um prazer contar com a tua colaboração para esta entrevista na web da AITF. Podes contar-nos um pouco sobre a tua formação e experiência como treinador de futebol?
AV: “Antes de mais, quero agradecer o convite e a oportunidade de fazer parte da AITF.
Em resposta à tua pergunta, fiz vários cursos de formação porque compreendo que o futebol evoluiu até se tornar numa grande indústria cujo desenvolvimento se baseia no conhecimento académico. Por isso, percebi que não bastava ter sido jogador; era necessário complementar essa experiência com uma sólida preparação. Ao longo dos anos, trabalhei constantemente para melhorar a minha formação e oferecer o melhor de mim aos jogadores e clubes com os quais colaborei e continuo a colaborar.
Obtive a certificação como treinador UEFA PRO após concluir os meus estudos na escola da Federação Espanhola de Futebol, através da territorial de Madrid. Lá, tive a oportunidade de realizar diversos cursos de especialização, como “Adaptação do método espanhol ao futebol internacional” e outro que adorei: “Análise de scouting e desempenho desportivo”. Além disso, procurei ampliar os meus conhecimentos noutras áreas do futebol, realizando o mestrado em “Direção Desportiva” da Associação Nacional de Treinadores de Futebol de Madrid.
Acredito que esta formação abriu muitas portas, não só em vários clubes de Espanha, mas também a nível internacional. Tive a oportunidade de trabalhar em países como a Argélia, o Paraguai e a Bolívia, ocupando cargos e funções diretamente relacionadas com as áreas de formação mencionadas.”
AITF: Como é que a tua experiência internacional influenciou a tua abordagem como treinador? Qual a importância de ter uma rede de apoio e representação no estrangeiro, como a AITF?
AV: “Trabalhar em diferentes países transforma, sem dúvida, a tua visão inicial sobre o futebol e até mesmo a forma como conceptualizas o jogo. Ao concluir a formação como treinador, estás fortemente influenciado pelas lições dos teus professores e pelas tuas próprias preferências. No meu caso, ao obter a certificação e iniciar a carreira, acreditava firmemente que um método “X” seria determinante para melhorar os jogadores e alcançar os objetivos de cada projeto.
Contudo, com o tempo e a experiência, percebes que as características específicas dos clubes e países onde trabalhas desafiam as tuas ideias iniciais. Este processo de adaptação e evolução é dos mais marcantes na profissão. Trabalhar em culturas diferentes, com estilos e tradições próprios, leva-te a ajustar e enriquecer a tua forma de trabalhar, afastando-te de visões iniciais rígidas.
Chegar a um novo país para trabalhar é uma experiência emocionante, mas também um desafio. Há incertezas quanto ao sistema fiscal, requisitos legais para alugar uma casa, abrir uma conta bancária ou mesmo compreender o custo de vida.
Por estas razões, contar com uma organização como a AITF, que te apoia e orienta em qualquer parte do mundo, é fundamental. A segurança de começar a trabalhar sem receio de cometer erros ou enfrentar problemas legais dá-nos a confiança necessária para nos focarmos no nosso desempenho profissional.”
AITF: Ao longo da tua carreira, como tens visto a evolução das oportunidades para os técnicos ibero-americanos no estrangeiro, especialmente na América do Sul?
AV: “Os treinadores ibero-americanos são altamente valorizados, não só na América do Sul, mas também noutras regiões onde trabalhei. A formação, a qualidade dos conhecimentos e as ferramentas que utilizamos para ajudar os jogadores a progredirem são muito apreciadas.
Não se trata apenas da metodologia, mas também da utilização eficaz de ferramentas avançadas, como a análise estatística e os videoanálises. Estas tecnologias, que utilizamos frequentemente na Europa, permitem melhorar o desempenho dos jogadores e aumentar a competitividade das equipas e projetos em que participamos.”
AITF: Que mensagem gostarias de transmitir a outros técnicos ibero-americanos na América do Sul que estejam a ponderar juntar-se à AITF? Que benefícios podem obter ao fazer parte desta rede de técnicos?
AV: “Como técnicos, sabemos que o trabalho em equipa é essencial para alcançar qualquer objetivo. Estamos conscientes do seu valor e da sua importância, porque a nossa profissão depende da colaboração e do esforço coletivo.
Por isso, a mensagem é clara: é essencial contar com uma equipa que trabalhe por nós e nos traga tranquilidade, ocupando-se de aspetos que, se mal geridos, podem afetar o nosso desempenho profissional. O apoio e as oportunidades oferecidas pela AITF representam essa “outra equipa” que devemos ter ao nosso lado, um suporte indispensável para alcançar os nossos objetivos e garantir que podemos concentrar-nos plenamente no nosso trabalho.”
AITF: Quais os desafios específicos que enfrentaste ao trabalhar no futebol boliviano, e como achas que essas dificuldades podem preparar melhor um treinador para atuar noutras ligas internacionais?
AV: “No futebol boliviano, enfrentam-se inúmeros desafios que afetam diretamente o trabalho do corpo técnico. Por exemplo, a falta de planeamento adequado nos torneios e competições é um problema recorrente. Muitas vezes, essas situações obrigam-nos a alterar os planos de trabalho ou, em casos extremos, a cancelá-los por completo. As datas de início ou reinício das competições são frequentemente alteradas ou canceladas inesperadamente, gerando frustrações e complicações. Por isso, é crucial ter sempre um plano “B” para enfrentar essas eventualidades.
Outro desafio significativo é a falta de recursos para treinar. Muitas vezes, não há a infraestrutura necessária para realizar o trabalho de forma ideal. Isso exige uma enorme capacidade de adaptação por parte do corpo técnico, que tem de encontrar alternativas para manter o trabalho regular dentro das limitações.”
AITF: Qual foi a tua experiência com a adaptação à metodologia de treino na Bolívia? Que conselhos darias a outros técnicos ibero-americanos que pretendam trabalhar neste país?
AV: “No que diz respeito aos aspetos metodológicos, há um atraso evidente no futebol boliviano. Predominam métodos de trabalho descontextualizados, o que significa que, ao receber um jogador, surgem dificuldades nas suas capacidades perceptivas e cognitivas devido à falta de estímulo recebido nessas áreas.
Esses métodos, na sua maioria fragmentados, não favorecem o desenvolvimento integral do jogador. Como consequência, os jogadores tendem a demorar mais tempo a adaptarem-se a metodologias contemporâneas. É-lhes difícil interpretar situações novas ou diferentes devido à falta de estímulo cognitivo prévio, o que torna mais complicado obter resultados a curto prazo.
Este cenário evidencia a necessidade de continuar a investir na formação e atualização metodológica, para que seja possível alcançar um progresso real no desenvolvimento dos jogadores e das equipas.”
AITF: Qual é a perceção do treinador ibero-americano na Argélia e no norte de África? Que perfis são mais procurados pelos clubes desta região?
AV: “O treinador espanhol é muito valorizado e bem recebido no norte de África. Países como a Argélia e Marrocos tornaram-se destinos interessantes para treinadores ibero-americanos, devido ao valor que acrescentam aos clubes. Estas ligas e equipas reconhecem a chegada de profissionais com boa formação, que contribuem não só no plano desportivo, mas também em áreas como metodologia, logística, planeamento, nutrição e gestão desportiva.
Os perfis mais procurados nesta região são os de formadores e preparadores físicos, que possam ajudar na formação de novos profissionais e fortalecer as estruturas desportivas de base.”
AITF: Tens algum conselho relacionado com a mudança para a Argélia que consideres importante para um técnico ibero-americano antes de se deslocar para este país?
AV: “Antes de iniciar um projeto em países como a Argélia, é fundamental garantir aspetos essenciais, como a habitação e as obrigações fiscais. Para os estrangeiros, o processo de alugar uma casa pode ser complicado, e enfrentam-se também taxas elevadas ao tentar retirar dinheiro de bancos ou realizar transferências para o exterior.
Estes desafios são áreas onde a AITF pode oferecer um apoio valioso, ajudando os técnicos a ultrapassar estas dificuldades. No entanto, são questões que devem ser cuidadosamente analisadas antes de aceitar qualquer projeto nesta região.”
AITF: Espanha é conhecida pelo avanço das suas metodologias de treino e pela qualificação dos seus técnicos. Na tua opinião, que qualidades tem o treinador sul-americano que podem fazer a diferença neste contexto? Que conselhos dás a quem estiver a pensar vir treinar em Espanha?
AV: “Como mencionaste, em Espanha encontramos um ambiente altamente profissional, com um elevado nível de qualificação. Estamos sujeitos a uma avaliação constante, em que os resultados do nosso trabalho serão o principal indicador do nosso desempenho. Por isso, devemos estar preparados e focados para enfrentar estes desafios com total compromisso.
Não nos podemos esquecer de que trabalhamos com pessoas antes de trabalharmos com atletas. Este é um ponto onde acredito que o treinador sul-americano tem uma vantagem diferencial: a capacidade de criar uma relação mais próxima e calorosa com os jogadores. A nossa forma de ser, moldada pela nossa educação e cultura, permite-nos estabelecer um vínculo mais humano e empático, o que pode ser decisivo na relação treinador-jogador.
O meu conselho para quem pretende trabalhar no futebol espanhol é claro: mantenham a mente aberta, preparem-se para aprender e adaptem-se rapidamente às metodologias e regras que possam ser diferentes das que estão habituados. A chave está em adotar, aplicar e desenvolver estas práticas, mostrando flexibilidade e empenho na excelência que este ambiente exige.”
AITF: Para concluir, que mensagem gostarias de deixar aos técnicos ibero-americanos que ainda não fazem parte da AITF?
AV: “A minha mensagem é simples: a AITF não é apenas uma rede de profissionais, mas uma verdadeira comunidade que compreende as necessidades dos técnicos de futebol. Aqui, encontramos apoio, formação e uma plataforma para partilhar experiências com colegas que enfrentam desafios semelhantes.
Juntar-se à AITF é investir no teu desenvolvimento e na tranquilidade de saber que tens o suporte de uma equipa comprometida com o teu crescimento profissional. Sem dúvida, é uma ferramenta indispensável para aqueles que desejam deixar a sua marca no futebol internacional.”
A AITF trabalha para criar ligações entre treinadores de todo o mundo, oferecendo oportunidades de crescimento e desenvolvimento em mercados internacionais. Se és treinador e desejas melhorar a tua carreira ou partilhar as tuas experiências, convidamos-te a juntar-te à nossa comunidade. Torna-te membro da AITF e faz parte de uma rede global que apoia e potencia o talento dos técnicos de futebol!
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